quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

SEASON 2 - FINALE

A cena começa comigo à varanda. É de noite. Está vento. Estou a olhar para a direita, para Cascais. Tenho um copo de champagne no parapeito e estou a acender um cigarro. Guardo o isqueiro no bolso e pego no copo de champagne. Olho para a direita, para Cascais. Estou em casa, é um oitavo andar. Consigo ver o céu, o mar, os prédios, a rua. O vento frio incomoda-me mas vou ficar aqui parado. Parado como alguém que não se consegue mexer. Não é como alguém que não se quer mexer, é como alguém que não se consegue mexer. Estou a olhar para direita com um copo de champagne na mão e um cigarro na outra. Estou de costas e se houvesse uma câmara ela começaria a afastar-se de mim, devagar. Primeiro sai da varanda, o plano não muda, sou apenas eu sozinho ao fundo, cada vez mais distante, mostra o quarto vazio sem se desviar de mim e depois a sala, a mesa com um prato apenas e demasiada comida para uma pessoa, demasiadas coisas para uma pessoa. Estou sozinho a olhar para a direita, para Cascais. Sou uma figura ao fundo, na varanda, com um quarto e uma sala entre nós, quase não se percebe que sou eu. Parece que a cena vai acabar porque é assim que as cenas acabam, com a câmara a afastar-se e a deixar a personagem sozinha, pequena, como se não tivesse saída, como se ela fosse ficar ali presa para sempre, a olhar para a direita, a olhar para Cascais. Mas afinal, não. Em vez de acabar assim, primeiro, as cores no céu, depois, o barulho do fogo-de-artifício. É meia-noite. As pessoas abraçam-se nas varandas, as pessoas beijam-se nas varandas. As pessoas estão felizes. As pessoas estão muito felizes. Eu olho para elas. Estou a olhar para elas e não se consegue perceber no que estou a pensar. Sou uma personagem misteriosa. Ou então sou apenas uma pessoa com um copo de champagne numa mão e um cigarro noutra. Olho para o fogo-de-artifício, para as cores no céu. As cores do fogo-de-artifício reflectem-se na minha cara. É tudo muito cinematográfico. Nem sequer uma palavra. Não há uma palavra. Podia dizer qualquer coisa, mas nada há a dizer porque tudo o que era preciso dizer já foi dito. A imagem basta para explicar a situação.
É a noite de fim de ano e eu estou sozinho em casa. Ouve-se uma música dos anos 50. As pessoas calam-se porque se houvesse uma câmara estava fixa na minha cara com a música dos anos 50 em fundo. Olho para o fogo-de-artifício com as cores a reflectirem na minha cara. Fumo o cigarro. Bebo o champagne. Olho para dentro de casa e há um blackout enquanto a música dos anos 50 continua.

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