segunda-feira, 2 de novembro de 2015

THE LONG ROAD AHEAD

E de repente estamos em Novembro. E de repente está frio. O tempo move-se a diferentes velocidades consoante o ritmo dos sentimentos. Parece que passaram anos desde que comecei a riscar os dias num calendário na parede, e parece que passaram dias desde que deixei de o fazer. Ontem estávamos os três a olhar para o mar, quase levávamos com uma onda, lembrei-me dos Tindersticks, de uma música dos Tindersticks que ouvi pela primeira vez há quase 20 anos. Fui a um concerto deles no Coliseu e não me consigo lembrar com quem, não me consigo lembrar quem é que abracei e beijei nessa noite enquanto o Stuart Staples (que está tão velho) dizia,
– Funny how everything makes you feel low when you’re already low.
Esqueço-me das coisas.  Não me lembro quem abracei e beijei nessa noite e nem me lembro se cantaram essa música. Mas agora gosto de pensar que tocaram essa música e que beijei e abracei alguém. Fomos para casa e pu-la a tocar. Acho que a ouvimos umas dez vezes seguidas. Quando ouviste o despertador no final disseste,
– isto és tu,
e eu ri-me.
À noite fomos ver o Ricardo III e gostámos. Bebemos uma cerveja e voltei para casa. Sentei-me e olhei para as minhas orquídeas novas, que comprei esta semana. Ainda não gosto delas. Parecem falsas, feitas de plástico. Mas já as reguei, mesmo que ainda não consiga falar com elas nem beijá-las. Olhei para a parede e pensei,
– não vou conseguir fazer isto,
mas vou.
Acordei cedo. Deixei-me ficar na cama a olhar para o relógio durante meia hora, a ver o tempo a passar e eu deitado durante meia hora. A minha casa parece maior do que é, acho que sei porquê. Queria ter explicado ao Tiago o porquê dos Domingos serem tão longos mas não lhe disse nada. A tarde passou. Em vez de ouvirmos músicas antigas dos Tindersticks vimos um filme. Lá fora chovia. Às vezes chovia.
À noite sentei-me ao balcão e pedi um café. Não sei porque bebo café. Acho que é o hábito. Um homem estava sentado ao meu lado. Já tinha bebido demais e estava a querer falar com as pessoas. Perguntou-me,
– sabe como é que se chama um boomerang que não volta para trás?
Eu disse,
– não,
sem sequer ter ouvido o que ele disse. Mas depois ouvi o que ele perguntou. E percebi que não sabia a resposta, que não sabia mesmo a resposta, que não havia nada que eu pudesse dizer que fizesse sentido. Olhei para ele e pareceu-me que o conhecia. Mas não o conhecia.
– Não sabe como é que chama um boomerang que não volta para trás?
– Não,
repeti,
– não sei.
– Então ouça-me com atenção porque vou dizer-lhe a coisa mais importante que ouviu na vida. Tenho estado a olhar para si, tenho estado a observá-lo, a beber o seu café, com um ar de superioridade sobre nós todos – a arrogância não lhe fica bem – pois agora vou dizer-lhe para olhar para mim – olhe para mim –  olhe para mim e perceba a simplicidade das coisas: não sabe como é que se chama um boomerang que não volta para trás?
– Não, não sei como se chama um boomerang que não volta para trás.
– Chama-se um pau. Um boomerang que não volta para trás é apenas um simples e inútil pau.
E depois pagou, levantou-se e foi-se embora.
E eu fiquei sozinho, sentado ao balcão.

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