É quase meia-noite e estamos os três numa varanda com mais
gente à nossa volta. O Pedro faz 30 anos e juntámo-nos para celebrar com vinho
e comida vegetariana. Estamos a falar de As
Raposas, que estreia na sexta-feira. O Victor diz que Walter Benjamin
considerava o coleccionismo como um elemento de elevação do ser humano, não sei
se foi isto que ele disse porque estou distraído a mandar uma mensagem enquanto
eles falam,
– uns coleccionam objectos, outros arte, outros namoradas.
O Pedro ri e o Victor também. Ambos olham para mim. O Pedro diz que devíamos utilizar isto, o aqui e o
agora no jogo com o espectador (por alguma razão estranha ambos acham que eu
sou uma boa desculpa para a criação de um espectáculo), o Victor diz que o
telemóvel também tem de entrar, que o público devia ver as mensagens e eles os
dois não. Eu tento defender-me. Não colecciono nada. Só tento ser uma pessoa
normal.
Uma hora antes, a propósito de normalidade, contava eu que
uma aluna, depois de me encontrar no supermercado, me perguntou junto à caixa,
– o professor também vai às compras?
como se a minha presença ali, naquele sítio tão mundano,
fosse uma aberração do universo, uma contradição da ordem natural das coisas.
Acho que era isso que queria dizer na mensagem, que sou uma
pessoa normal, com uma vida normal. Sonho como todos sonhamos e sou ridículo
como todos somos ridículos.
Depois a noite continuou e eu vim para casa sem dizer o que
realmente queria dizer.
Sem comentários:
Enviar um comentário