sexta-feira, 1 de maio de 2015

A COISA MAIS ESTRANHA

Podia ser a pergunta de um concurso de variedades. Qual foi a coisa mais estranha que lhe aconteceu? Estou a ver os sofás azuis brilhantes ou cor-de-rosa e as pessoas a rirem muito enquanto dizem que a coisa mais estranha que lhes aconteceu foi:
1)  MULHER 1 – Encontrar o namorado com o João na casa-de-banho e com as calças para baixo (o público em uníssono: AH AH AH – aplausos).
2) HOMEM 1– Acordar no hospital depois da queima das fitas, em Coimbra, sem dentes na boca e com as duas pernas partidas (o público em uníssono: AH AH AH –  aplausos).
3)  MULHER 2 – Ir a um concerto de música clássica na Gulbenkian com aqueles intelectuais todos ao meu lado (o público em uníssono: AH AH AH – aplausos).
4)  HOMEM 2 – Ser assaltado por dois pretos que até as cuecas me queriam levar e depois aparecer a polícia que lhes partiu a boca toda enquanto eu dizia: «tenham calma, senhores guardas» (o público em uníssono: AH AH AH – aplausos).
5)   MULHER 3 (mastigando pastilha elástica) – Entrar numa novela como figurante e acabar na cama de um actor, que não vou dizer o nome (como é óbvio - dah), que me prometeu que eu ia ser uma estrela e que depois de eu lhe fazer sexo oral me mandou embora de casa sem me dar o número de telefone  (o público em uníssono: AH AH AH –  aplausos).
6)  HOMEM 3 – (um convidado especial, famoso) Assistir a este programa (o público em uníssono: AH AH AH – aplausos).
7) MULHER 4 – Não sei. Muitas coisas. Estou tão nervosa. (o público em uníssono: AH AH AH – aplausos).
8) HOMEM 4 – Essa é uma pergunta complexa, talvez aquele dia em que percebi que o tempo existe como uma dimensão e que é uma coisa, entre aspas, palpável, apesar de nós não a podermos sentir. Percebe o que estou a dizer… Stephen Hawking, Albert Einstein… Enfim, quem somos nós no universo? Ou apaneas, quem somos nós? (o público em uníssono: AH AH AH – aplausos).
9) MULHER 5 – A coisa mais estranha? A coisa mais estranha? (silêncio) A coisa mais estranha? (Ela própria: AH AH AH e aplaude).
10) MIGUEL GRAÇA – Um dia traduzi o Peer Gynt. de Henrik Ibsen. Em verso rimado. Uns 2500 versos, depois dos cortes. Estava a enlouquecer. Não foi fácil. Cada verso que passa é uma nova vitória/ mas são tantos os versos e não lhes vemos a glória.  (o público em uníssono: AH AH AH – aplausos). Não conseguia pensar. Mas naquele dia, no primeiro dia de Maio, que é agora, hoje de madrugada, eu fui o Peer Gynt.Fui mesmo. Não o vi nem o senti do outro lado do quarto. Eu era ele. Eu era mesmo ele. (o público em uníssono: AH AH AH – aplausos).

Sem comentários:

Enviar um comentário