Estamos os três sentados ao balcão do bar. Elas queixam-se que não entram nas minhas crónicas, que toda a gente entra nas minhas crónicas menos elas. Eu digo-lhes que estou a escrever uma peça, que agora não consigo escrever mais nada. Elas perguntam,
– é sobre quê?
e eu fico a olhar para elas a pensar no dia em que me vão dizer,
– Miguel, precisamos de uma sinopse.
Peço outro copo e olho para as garrafas. Tudo me está a correr mal ou tudo continua a correr mal. À tarde, deitado no sofá, peguei numa caneta e no caderno que me deu a Madalena e escrevi,
Havia um rapaz que vivia sozinho. Acordava sozinho, levantava-se sozinho, tomava banho sozinho, despedia-se sozinho, conduzia sozinho, chegava sozinho, ia-se embora sozinho, comia sozinho, fazia o almoço sozinho, regressava sozinho, falava sozinho, fumava sozinho, fazia compras sozinho, fazia o jantar sozinho, jantava sozinho, via televisão sozinho, bebia café sozinho, passeava sozinho, conversava sozinho, andava de um lado para o outro sozinho, pensava sozinho, bebia sozinho, ria-se sozinho, sorria sozinho, voltava sozinho, ficava parado a olhar para a noite sozinho, ficava quieto a olhar para ele próprio sozinho, a olhar para a janela sozinho, a olhar para as flores sozinho, a dormir sozinho, a sonhar sozinho. Havia um rapaz que vivia sozinho e havia uma rapariga que vivia sozinha. Ficaram os dois sozinhos.
– Nunca escreves sobre nós,
disseram elas.
Eu abri o caderno que me deu a Madalena e disse-lhes,
– hoje escrevi isto, amanhã vou escrever sobre vocês.
Elas estão a ler. Eu peço outro copo. Às vezes pedem a minha ajuda para decifrar a caligrafia. Às vezes nem eu próprio sei o que escrevi.
Elas acabam de ler. Elas olham para mim. Uma delas diz,
– Havia um rapaz?
Ambas se riem.
– Como assim?,
digo eu.
– Eu gostei. Um bocadinho depressivo. Mas tu não és um rapaz,
diz uma.
– Eu também gostei, vê-se que és tu,
diz a outra,
– mas estás a envelhecer. Olha-se para ti e vê-se os anos a passar mais depressa do que eles passam. Estás mais velho do que és.
– Havia um homem que um dia foi um rapaz?
E depois venho para casa, sozinho.
– é sobre quê?
e eu fico a olhar para elas a pensar no dia em que me vão dizer,
– Miguel, precisamos de uma sinopse.
Peço outro copo e olho para as garrafas. Tudo me está a correr mal ou tudo continua a correr mal. À tarde, deitado no sofá, peguei numa caneta e no caderno que me deu a Madalena e escrevi,
Havia um rapaz que vivia sozinho. Acordava sozinho, levantava-se sozinho, tomava banho sozinho, despedia-se sozinho, conduzia sozinho, chegava sozinho, ia-se embora sozinho, comia sozinho, fazia o almoço sozinho, regressava sozinho, falava sozinho, fumava sozinho, fazia compras sozinho, fazia o jantar sozinho, jantava sozinho, via televisão sozinho, bebia café sozinho, passeava sozinho, conversava sozinho, andava de um lado para o outro sozinho, pensava sozinho, bebia sozinho, ria-se sozinho, sorria sozinho, voltava sozinho, ficava parado a olhar para a noite sozinho, ficava quieto a olhar para ele próprio sozinho, a olhar para a janela sozinho, a olhar para as flores sozinho, a dormir sozinho, a sonhar sozinho. Havia um rapaz que vivia sozinho e havia uma rapariga que vivia sozinha. Ficaram os dois sozinhos.
– Nunca escreves sobre nós,
disseram elas.
Eu abri o caderno que me deu a Madalena e disse-lhes,
– hoje escrevi isto, amanhã vou escrever sobre vocês.
Elas estão a ler. Eu peço outro copo. Às vezes pedem a minha ajuda para decifrar a caligrafia. Às vezes nem eu próprio sei o que escrevi.
Elas acabam de ler. Elas olham para mim. Uma delas diz,
– Havia um rapaz?
Ambas se riem.
– Como assim?,
digo eu.
– Eu gostei. Um bocadinho depressivo. Mas tu não és um rapaz,
diz uma.
– Eu também gostei, vê-se que és tu,
diz a outra,
– mas estás a envelhecer. Olha-se para ti e vê-se os anos a passar mais depressa do que eles passam. Estás mais velho do que és.
– Havia um homem que um dia foi um rapaz?
E depois venho para casa, sozinho.
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