quarta-feira, 22 de abril de 2015

ON THE ROAD (1)

Doem-me as costas e estou cansado. O hotel é agradável mas o bar já estava fechado. Felizmente antecipei essa possibilidade e comprei uma garrafa de Canadian Club no freeshop de Zurique onde estive duas horas a andar de um lado para o outro, à espera que o tempo passasse.
A viagem até Zurique não foi agradável. Vim ao lado de uma daquelas pessoas que acha que fazer conversa é o estado normal do ser humano e que se duas pessoas estão sentadas ao lado uma da outra têm obrigatoriamente de partilhar as suas experiências. De maneira que lá fui ouvindo sem interesse as histórias deste francês que se apelidou de mounsieur de Maistres, um conversador nato que não parou de falar das suas viagens pelo mundo. Tentei ser simpático no meu francês limitado, e devo ter conseguido porque o senhor não se calou.
Dei aulas até às seis e meia, o que foi estranho, e parece ainda mais estranho agora. Passei o dia todo com a sensação de ser uma espécie de Lucas Corso, preparado para me ir embora a qualquer altura, apenas com o que tinha comigo, passaporte e dinheiro. Se calhar não precisamos de mais nada, apenas de dinheiro e de um passaporte. O Lucas Corso era um caçador de livros, eu sou um caçador de palavras. Não estava a conseguir encontrá-las e num impulso que talvez me arrependa, anteontem decidi fazer as malas, reservar uma passagem e ir à procura delas sem dizer nada a ninguém.
Estou num quarto de hotel em Oslo, uma hora à frente de quem me lê agora, em Portugal. Às vezes temos de nos ir embora, de deixar tudo o que nos rodeia e apenas ir embora. Não sei se tenho medo de ter vindo assim, sozinho e sem destino, ou se tenho medo de não regressar.
Quando traduzo uma obra tenho de me transformar no autor, ou pelo menos tenho de ter essa ilusão. E o Ibsen não estava a aparecer, e o Peer Gynt não estava a aparecer. Vai para a Noruega, disse-me a minha cabeça. Talvez não resolva nada, mas talvez ajude. E anteontem pedi dez dias de férias e hoje estou aqui, em Oslo. Da janela do meu quarto vejo uma cidade tão calma que parece parada. Estava à espera de encontrar montanhas,  
Amanhã tenho de me levantar cedo. Vou visitar a Casa Ibsen antes do almoço e depois alugar um carro para ir até Skien onde vou ficar uns dias (espero), apesar de não ter reservado hotel.
Estou cansado. Está frio lá fora. Não posso fumar. Estou num país distante. Tantas coisas que podem acontecer.

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