Eu estava nervoso. A Ana,
o Pedro, o Fillol, a Rita e o Sá vieram ver o ICTUS. São os meus amigos mais
antigos. Não os vejo durante meses. Aniversários e pouco mais. Gosto tanto
deles e de estar com eles. Mas é assim que a vida se faz, cheia de pessoas que
não vemos e de abandonos, cheia de recordações que se atiram para uma mesa com
um sorriso. E passaram quantos anos, perguntamos a meio da conversa?
Eu não estava nervoso por
causa deles, estava nervoso por causa da Ana.
Namorei cinco anos com a Ana. Mais.
Acho que foram cinco anos e meio.
A Ana é a melhor recordação que tenho. Quando
nos decidimos separar, ambos sabíamos por que o estávamos a fazer, e ambos o
queríamos fazer. Desses cinco anos e meio que passámos juntos, muita coisa
correu mal. Houve muitos gritos, lágrimas e dor. Às tantas já não conseguíamos
sequer olhar um para o outro. Hoje não me lembro de como isso aconteceu, nem me
lembro de sentir isso. Houve muita ingenuidade. Éramos miúdos a tentar ser
adultos. E havia tanta coisa contra nós: a família, os cursos, a rotina. Não
estou a dizer tudo. Não gosto quando não estou a dizer tudo. Vou dizer tudo no
próximo parágrafo.
Hoje quando me lembro de
ti, Ana, só me lembro da tua cabeça no meu colo. É disso que me lembro.
Esta merda de vida que
faz de nós estranhos.
Esta merda de vida.
Fiquei
tão nervoso quando te vi. Fiquei tão feliz quanto te vi. Fiquei tão triste quando
te vi. Porque não merecemos, pois não, Ana? Não merecemos o que nos aconteceu. E é tão tarde para voltar para trás, não é, Ana? É tão tarde para voltar para trás. Mas podemos voltar para trás, Ana. Achas que podemos? Eu não sei, porque eu não sei nada. Mas tu? Achas que podemos? Achas que ainda podemos?